Dr. Luiz Flávio
A endometriose é uma doença inflamatória crônica que afeta principalmente mulheres na menacme — idade fértil, que compreende desde a primeira menstruação (menarca) até a fase da menopausa. Tal condição pode causar infertilidade, além de vários outros prejuízos na vida da mulher.
Por ter diferentes manifestações, a endometriose é classificada de acordo com a área afetada, podendo ocorrer nos órgãos do sistema reprodutivo feminino ou em outras regiões do corpo humano — sobretudo na cavidade abdominal e pélvica —, embora tais manifestações sejam raras.
O tipo mais grave de endometriose, a endometriose profunda, pode apresentar manifestação clínica mais exuberante. No entanto, os outros tipos da doença também requerem atenção e cuidados, devido aos riscos que oferecem.
A prevalência de endometriose em mulheres em idade reprodutiva é estimada em até 15%. Embora não se conheça a incidência exata da endometriose profunda nas pacientes, estima-se que ela afete cerca de 20 a 30% das mulheres portadoras da doença.
A infertilidade é um quadro que se manifesta em até 40% das mulheres com endometriose profunda. Além disso, tal manifestação da doença tem grande influência na qualidade de vida das pacientes.
Mulheres que sofrem dessa doença e desejam engravidar se preocupam com a forte associação da endometriose com a infertilidade. Entretanto, há a possibilidade de que pacientes com endometriose profunda consigam engravidar, mesmo espontaneamente. Leia mais sobre isso no texto!
Essa doença crônica é definida pela presença do tecido endometrial fora da cavidade uterina. O endométrio é o tecido que reveste a camada interna do útero, a parede uterina, sendo o local no qual o embrião se fixa para que a gravidez possa se desenvolver.
A presença atípica desse tecido pode ocorrer em qualquer localização do organismo feminino, embora seja mais comum que fragmentos do endométrio sejam encontrados na região pélvica.
Dessa forma, existem atualmente algumas classificações para a endometriose, levando em consideração a localização do tecido endometrial e quão afetados foram os órgãos nos quais esse tecido se faz presente. Uma destas classificações as divide em endometriose superficial; ovariana ou endometrioma; e profunda.
A doença ainda é classificada de acordo com a profundidade das lesões, configurando os níveis de gravidade mínima, leve, moderada e grave.
A endometriose superficial peritoneal é o tipo mais leve da doença e pode acometer toda a extensão do peritônio. Nessa condição, os implantes de tecido endometrial ectópico são rasos e não oferecem prejuízo significativo aos órgãos.
Entretanto, existe a recomendação do acompanhamento médico regular, com a finalidade de acompanhar os possíveis agravamentos da doença e o acometimento dos órgãos próximos à camada peritoneal.
Endometrioma
Também chamados de endometriose ovariana, os endometriomas se desenvolvem quando os fragmentos endometriais se implantam nos ovários e formam cistos. A doença pode evoluir de forma unilateral ou bilateral, apresentando poucas ou múltiplas bolsas císticas.
Os endometriomas são preenchidos por uma substância escura e espessa, de coloração achocolatada. Seu conteúdo é resultado do acúmulo de sangue degradado, visto que, a cada ciclo menstrual, os focos de células ectópicas do endométrio respondem à ação dos hormônios e sangram — assim como ocorre com o tecido endometrial intrauterino.
A endometriose infiltrativa profunda é considerada a forma mais severa da doença. Ela consiste na presença do tecido endometrial com mais de 5 mm de profundidade no peritônio, membrana que recobre a cavidade abdominal e a superfície da maioria dos órgãos.
A endometriose profunda pode afetar também os ligamentos uterinos, a bexiga, os ureteres, o intestino e o septo retovaginal. Em quadros bastante raros, os implantes endometrióticos são localizados em partes vitais do organismo, como pulmões e pericárdio.
A forma mais agressiva da endometriose causa inflamação que abrange uma área maior que os outros dois tipos de manifestação da doença, sendo fortemente associada à infertilidade feminina.
Considera-se que uma paciente esteja grávida quando o embrião consegue se implantar com sucesso na parede uterina, etapa que recebe o nome de nidação. A presença do tecido endometrial em outros órgãos pode causar inflamações e impor obstáculos em diferentes momentos do processo reprodutivo.
Os focos de endometriose podem prejudicar o funcionamento e a anatomia das tubas uterinas, dos ovários e do útero, órgãos que compõem o sistema reprodutor feminino. Quando isso ocorre, processos necessários para a obtenção de uma gestação, como a ovulação, podem ser prejudicados ou até mesmo impossibilitados. Possíveis deformações do útero também dificultam a implantação do embrião na parede uterina, causando abortos espontâneos.
Assim sendo, a endometriose pode afetar todos os processos relacionados à fertilidade, desde a ovulação, passando pela fecundação e pela nidação. Além disso, pode ainda levar à gestação de alto risco, necessitando de um acompanhamento pré-natal mais especializado.
Sim! Conforme o tipo de endometriose, a mulher pode encontrar mais dificuldade para engravidar.
Vamos, novamente, diferenciar as classificações da doença para compreender como cada tipo de endometriose pode interferir no processo reprodutivo e quais são as melhores alternativas de intervenção.
A doença superficial peritoneal, como vimos, é caracterizada por implantes rasos no peritônio. Portanto, as células ectópicas não chegam a se infiltrar nos órgãos reprodutores e não interferem em suas funções. Ainda assim, algumas mulheres com esse diagnóstico apresentam a fertilidade reduzida.
Medicamentos hormonais podem ser administrados para melhorar a função ovariana e aumentar as chances de concepção. Em alguns casos, a paciente recebe orientação para procurar técnicas de reprodução assistida. A cirurgia fica restrita àquelas que apresentam sintomas dolorosos concomitantes ou que, por algum motivo, não vejam a reprodução assistida como opção.
Os endometriomas representam um desafio clínico e técnico no acompanhamento de mulheres que pretendem gestar. Dentre os tipos de endometriose, esse é um quadro bem preocupante, pois tanto a doença em si quanto o tratamento cirúrgico podem prejudicar as funções reprodutivas da paciente.
Conforme a quantidade e o tamanho dos cistos nos ovários, os órgãos são comprometidos de modo anatômico e funcional. Lembrando que a função ovariana está relacionada ao processo ovulatório, bem como à produção dos hormônios sexuais estrogênio e progesterona, importantes tanto para o ciclo menstrual quanto para a manutenção inicial da gestação.
Por sua vez, o procedimento cirúrgico pode ocasionar lesões no córtex do ovário, porção do órgão onde está a reserva ovariana — a qual refere-se ao número de óvulos armazenados.
Portanto, a intervenção nos casos de endometrioma deve ser bem estudada e a paciente precisa ser conscientizada de suas possibilidades e riscos. Nesse contexto, uma alternativa interessante é o congelamento dos óvulos, realizado na reprodução assistida, procedimento conhecido como preservação social da fertilidade. Assim, mesmo que a reserva ovariana seja impactada pela cirurgia, a mulher ainda terá a chance de engravidar com seus próprios gametas.
A endometriose infiltrativa profunda impõe ainda mais dificuldades nas tentativas de gravidez, visto que as lesões endometrióticas podem afetar várias etapas do processo reprodutivo.
Além do prejuízo ovariano, como já foi explicado, também há o risco de implantes profundos provocarem aderências nas tubas uterinas e, em casos mais graves, hidrossalpinge — presença de líquido no interior do órgão. Com isso, as trompas se tornam impermeáveis e o encontro dos espermatozoides com o óvulo é impossibilitado.
A endometriose ainda pode ter efeitos negativos no útero, tendo em vista que o ambiente inflamatório torna o órgão menos receptivo ao processo de implantação do embrião. Mesmo que a gravidez se confirme, os riscos da doença prevalecem, podendo dificultar o desenvolvimento fetal e ocasionar abortos.
A maior parte dos casos de endometriose profunda é tratada com cirurgia. O procedimento é feito por videolaparoscopia, cirurgia minimamente invasiva, e normalmente as pacientes apresentam boas chances de gestação natural após a excisão do tecido ectópico.
A infertilidade é clinicamente diagnosticada como a ausência de gestação após um ano mantendo relações sexuais regulares, sem a utilização de métodos contraceptivos.
Embora a endometriose profunda e os endometriomas sejam manifestações graves da doença, é possível realizar tratamentos que visem diminuir seu impacto no organismo feminino, a fim de recuperar a fertilidade da paciente.
Entretanto, é comum que muitas mulheres procurem um ginecologista ou médico especializado somente quando os sintomas de uma doença passam a atrapalhar sua rotina e a realização de atividades diárias.
Nesse sentido, pode haver atraso na busca por diagnóstico e tratamento, pois, em muitos casos, a endometriose se desenvolve em caráter assintomático. Da mesma forma, o quadro pode apresentar sintomas que as mulheres consideram comuns aos processos fisiológicos femininos, como a dismenorreia (cólicas menstruais intensas).
Portanto, é fundamental que pacientes em idade fértil consultem regularmente um médico, uma vez que o sucesso no tratamento de doenças como a endometriose está fortemente associado ao seu diagnóstico precoce. Quanto antes este for realizado, mais eficiente será a intervenção terapêutica e menor será o impacto na fertilidade.
Assim, o primeiro passo a ser tomado, caso a paciente manifeste o desejo de engravidar, é avaliar o efeito da presença da doença e seus eventuais sintomas. Em complemento, os exames ajudam a verificar a gravidade dos implantes endometrióticos e o nível de comprometimento do sistema reprodutor. Para tal, é realizada a ultrassonografia especializada para endometriose.
É somente após uma avaliação precisa, que o médico está apto a definir as condições dos órgãos reprodutores e, dessa forma, estimar as possibilidades de ocorrência de uma gravidez. A conduta terapêutica é, então, definida com base nas alternativas de tratamento mais apropriadas para cada paciente, conforme as características específicas de seu quadro.
Entretanto, apesar de uma forte associação com a infertilidade, a endometriose não é sinônimo de impossibilidade de gravidez. Como vimos, em algumas situações, a gestação espontânea é obtida, já em outras, a reprodução assistida deve ser procurada.
Em todo caso, com desejo reprodutivo ou não, as mulheres portadoras de endometriose necessitam procurar assistência técnica especializada, a fim de entender suas opções de tratamento e saber quando uma cirurgia é a melhor opção.
Aproveite que está aqui e saiba mais sobre a endometriose em nosso texto dedicado ao tema.